06/06/2017

Reforma trabalhista será umas das consequências mais nefastas do golpe de 2016

Por Marcio Kieller

Esse artigo que escrevi foi publicado no livro O GOLPE DE 2016 E A REFORMA TRABALHISTA – NARRATIVAS DE RESISTÊNCIA. Organizada pelo Instituto da Classe Trabalhadora – DECLATRA e pelo Projeto Editorial Práxis. Juntamente com uma coletânea de outros excelentes artigos sobre a Reforma Trabalhista. Obra indispensável para aqueles que estão combatendo as reformas políticas impostas pelo governo ilegítimo e sem votos de Michel Temer.  
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Há poucos anos observamos, consternados, a ofensiva neoliberal tirar do poder através de um golpe institucional e parlamentar o presidente Fernando Lugo, democraticamente eleito para a presidência do Paraguai. Poucos países e pessoas democráticas se mobilizaram e denunciaram o golpe institucional no Paraguai, pois ele não tinha a face mais perversa que os golpes civis e militares que tinham acontecido em quase totalidade dos países da América Latina na segunda metade do século passado: A violência física opressora do Estado.

A característica principal nesse formato desse processo intervenção política é a ausência de violência física opressora, ou seja, sem a truculência das forças armadas e dos aparelhos de repressão, das policias políticas, das polícias de ordem social e etc. Os golpes de novo tipo acontecem como se fossem processos democráticos, mais que de democráticos nada tem, pois se utilizam da mentira, da enganação coletiva e de elementos constitutivos do fascismo na construção do ódio, ao utilizar os instrumentos contidos nas constituições, que deveriam ser usados na defesa da democracias, contra a corrupção e o desmando dos governantes. E não usados para usurpa-la assim como vimos no Paraguai, e agora aconteceu no Brasil.

O que precisamos entender quando se implementam esses tipos de golpes civis e institucionais contemporâneos - a que pese que não possamos de forma nenhuma admiti-los e a eles temos que sempre resistir - é que eles são essencialmente civis e envoltos na utilização das regras de exceção contidas nas cartas constitucionais dos países em que estão sendo aplicados. Mas para que aconteçam precisam do apoio e da sustentação de setores da sociedade como grande empresariado, o setor financeiro, a mídia e os setores mais conservadores, que geralmente nos países capitalistas estão nas mãos de poucas elites urbanas e rurais.

E a manutenção dessas intervenções institucionais e a defesa de sua necessidade se constrói com a desqualificação política, a falta de argumentação e principalmente incentivo ao ódio de classe. No Brasil foi utilizada a mesma receita, pois a arquitetura política do golpe teve essa sustentação nas elites que foram desalojadas de suas posições estratégicas de mando dentro do Estado, dos meios de comunicação tradicionais que estão nas mãos de quatro ou cinco famílias, no capital financeiro do país, também calçada num Congresso Nacional conservador e reacionário e em parcelas do judiciário. Essa aliança estruturadora fez o resultado fosse o golpe político, institucional e parlamentar de agosto de 2016. Que levou o vice presidente Michel Temer, golpista mor e ilegítimo ao poder.

Dentro da nova leitura que se constrói a alternativa política de entrar no poder pela porta dos fundos. Ou seja, tirando do poder através de um impeachment sem crime, uma mulher honrada que não devia nada, tanto é que nem foi tornada inelegível perante aos “supostos crimes” que cometeu. Os patrocinadores do golpe capitaneados pelas entidades representantes da ganância empresarial como a Federação das Industria de São Paulo e outras Federações de Indústria de estados espalhadas pelo país, com ressonância nas grandes elites urbanas e rurais, em amplos setores do grande empresariado nacional, nas elites financeiras, conjuntamente com parcela do judiciário desaguou na arquitetura política no golpe institucional e parlamentar.

O que deve nos chamar a atenção na discussão política sobre as reformas é a quem elas atendem de fato? E sabemos que não é a classe trabalhadora. Muito pelo contrário a quebra do ciclo nacional desenvolvimentista que estávamos tendo no país tem o aval grande setores do empresariado que em determinado momento e de forma orientada resolve tirar o pé dos investimentos econômico, o que num determinado momento faz com que o ciclo de constante crescimento entre em crise.  E se observarmos isso começa acontecer no período anterior as eleições de 2014, onde setores do capital que apoiavam uma candidatura de oposição no Brasil jogavam todas suas fichas na possibilidade eleitoral que acontece de forma totalmente desigual. Inclusive alguns pensadores, chegaram a aventar que os jornais e revistas deviam conter o CNPJ da campanha presidencial de oposição, pois o jogo era extremamente cruel, especialmente no segundo turno das eleições de 2014, onde tínhamos o horário eleitoral gratuito e depois mais 30 minutos de jornais desancando o verbo sobre o governo e seus programas sociais. E mesmo nesse cenário desfavorável midiaticamente falando a oposição não teve o sucesso eleitoral.

Momento em que essas elites passam optar pela leitura política de que no voto seriam incapazes de ganhar as eleições face ao processo de inclusão social produzido no Brasil nos últimos 13 anos. Onde milhões de famílias foram incluídas, milhões de empregos foram gerados com carteira assinada, milhões de pessoas passaram a ter a atenção do Estado e deixaram de viver abaixo da linha de pobreza. O que possibilitou que o governo mantivesse o fortalecimento e o aprofundamento das políticas públicas e dos programas sociais. Também milhões de pessoas passaram a ter acesso ao ensino superior e participar de importantes programas como o Ciência Sem Fronteiras, um dos primeiros programas sócias que teve o seu fim decretado pelo governo ilegítimo de Temer. 

A ofensiva neoconservadora traduzida no discurso político da necessidade imediata da diminuição do tamanho do Estado por um lado e a ofensiva de engessamento econômico por outro estrangulando a economia a exemplo do que tem feito a operação Lava Jato em setores estratégico da economia nacional como o desmonte da Petrobras e do setor de alimentos, que atacam empresas, mas preservam o agronegócio. Setores capitaneados e patrocinados por entidades representantes da ganância empresarial como descrevemos acima, com ressonância em amplos setores do grande empresariado nacional. Esses setores esperam a curto e médio prazo o pagamento dos golpistas ilegítimos que foram conduzidos ao poder, em pesadas parcelas de retirada de direitos da classe trabalhadora. Com o aval de grande parte do Congresso Nacional o complô financiador do golpe passou a querer mudanças radicais na estrutura de governo, que caminhasse para a diminuição do tamanho do Estado e a consequente diminuição dos programas sociais e das políticas públicas. E a primeira ofensiva foi o congelamento dos investimento sociais por vinte anos, com a aprovação da PEC 241, que irá deixar uma geração no Brasil sem investimento. O que trará consequência danosas pois a sociedade não pode parar, e não para, cresce, e os investimentos estarão congelados. E a reforma trabalhista será uma das mais nefastas consequências desse golpe desferido contra a democracia e classe trabalhadora brasileira em agosto de 2016.

As trabalhadoras e trabalhadores brasileiros estão à prestes a ser enganados pela forma como se apresentam a questão das reformas trabalhistas e previdenciária no contexto atual. O governo ilegítimo e sem voto de Temer e o Congresso Nacional sustentado pelas editorias da mídia tradicional se encarregam de fazer o trabalho sujo de apresentar para a sociedade as reformas de forma fracionada, separada para que não para que não tenhamos condições objetivas de resistir a elas de forma conjunta. A sociedade precisa compreender que essas reformas das leis retiram direitos da classe trabalhadora, e que a reforma trabalhista e a reforma da previdência estão no mesmo pacote. Pois atingem frontalmente as trabalhadoras e trabalhadores. A argumentação em cima das ditas reformas é muito frágil, por parte de seus defensores, porém é feita de forma massificada e de forma enormemente desigual. Enquanto fazemos o debate com a classe trabalhadora no chão de fábrica, nas agências bancárias, postos de trabalho onde estão às trabalhadoras e trabalhadores. A mídia tradicional sobrecarrega essas mesmas trabalhadoras e trabalhadores com diversas doses, várias vezes, todos os dias nas grades dos jornais e nas propagandas do governo, que tentam vender mentirosamente que as reformas serão benéficas para a classe trabalhadora, versão essa que é também sustentada por setores do empresariado que querem a aprovação das reformas. A ofensiva neoconservadora veio traduzida no discurso político da necessidade da diminuição do tamanho do Estado no Brasil. Enquanto a iniciativa privada cresce seus olhos para os direitos das trabalhadoras e dos trabalhadores, querendo que o Estado se desresponsabilize das garantias mínimas e dignas de homens e mulheres trabalhadoras.

A Reforma trabalhista pretende mudar a estrutura do trabalho no Brasil. Pois quer que se enterre de vez por todas a Consolidação das Leis do Trabalho - CLT em vigor desde de 1943. E que infelizmente pela visão minimalista do empresariado com relação aos direitos trabalhistas, faz com que a CLT se faça ainda muito necessária nos dias de hoje. Entre as questões que podem sofrer ataques a principal delas é a questão da sobreposição do negociado sobre o legislado. Pois sem mexer na lei, querem burlá-la com a possibilidade de o negociado valer no lugar do legislado, o que traz um enorme perigo para as trabalhadoras e trabalhadores, principalmente para as categorias que não tem forte representação sindical e que podem ficar à mercê da chantagem da manutenção do emprego e terem que se submeter a retiradas de direitos e a precarização do trabalho, em questões fundamentais como a jornada de trabalho, flexibilização de férias e perdas na negociação de outros direitos fundamentais contidos na lei.

Um verdadeiro massacre dos direitos trabalhistas está previsto se a reforma trabalhista for aprovada, aliada aos ataques a justiça do trabalho. Por que esses setores que estão interessados na retirada de direitos querem também limitar a possibilidade da criação de passivos trabalhista e tentam com o negociado sobre o legislado evitar com que os trabalhadores tenham acessos aos seus direitos adquiridos com muita luta e transformados em lei. E também tentam na lei diminuir a possibilidade de que classe trabalhadora tenha menos tempo para recorrer desses direitos na justiça.

Os mantenedores do golpe acham que os trabalhadores adquiriram uma superproteção durante os governos democráticos e populares de Lula e Dilma e querem diminuir essa proteção, arvoram que estamos em outros tempos e que a legislação trabalhista não é atualizada para os tempos atuais. Mas na prática fazem justamente ao contrário com suas propostas de retirada de direitos, tentam remeter as relações de trabalho para tempos medievais, ao  propor que os trabalhadores não precisam mais de uma hora para almoço, que conseguem fazê-lo em apenas quinze minutos. Que podem fazer jornadas intermitentes, muitas vezes trabalhando em casa e utilizando se de seus com seus próprios recursos. Todo o problema da reforma trabalhistas, os ataques aos direitos são ainda piorados com a tentativa insistente da terceirização sem limites das atividades fim, sem a responsabilidade solidária do estado quando as empresas terceirizadas quebram, o que pode levar a um processo nefasto de quarteirização e ajuizamento de muita ações onde não se terá de quem cobrá-las.  

Por todas as propostas que vemos sair desse governo ilegítimo e de setores do congresso que representam o grande empresariado urbano e rural é que não veremos o povo ser beneficiado, não veremos nessas reformas trabalhistas e da previdência benefícios para a classe trabalhadora, somente prejuízos. Ainda mais se observarmos quão conservadoras são as posições desses setores no Brasil, que até hoje ainda não é signatário de diversas Convenções da Organização Internacional do Trabalho – OIT, as quais uma imensa gama de países já o é. Como a convenção 158 que versa sobre a dispensa imotivada por parte do empregador. Pois como vimos em paralelo o governo ilegítimo tenta no Congresso Nacional e mesmo através de pressão do STF aprovar a terceirização da atividade fim em diversas categorias de trabalhadores.

Através dessas reformas que vemos que o governo ilegítimo de temer tem pago com o chicote no lombo da classe trabalhadora a fatura do golpe institucional aos avarentos do capital. Não aos empresários pequenos e de porte médio, mas aos poucos empresários que concentram a comunicação do país e também aos grupos internacionais de olhos nas fortunas do pé-sal e do petróleo brasileiro da nossa Petrobrás. Também aos pequenos grupos de banqueiros, empresários da comunicação e grandes empresários urbanos e rurais que foram financiadores e são mantenedores do golpe assumindo a forma simbólica do “Cidadão Pato Boilesen” da FIESP e das elites empresariais que agora vão cobrar na integra, e o pagamento será através da retirada de direitos, das terceirizações, do desmonte da saúde, dos serviços públicos e do nosso patrimônio social e cultural com o congelamento dos investimentos públicos em setores essenciais da sociedade. Como a proposta de mudanças no ensino médio e na reforma da previdência social, e como vimos à reforma trabalhista com quebra de direitos e a implementação das terceirizações em áreas como saúde e educação para que as futuras gerações sejam dóceis e amedrontadas trabalhadoras e trabalhadores com educação limitada ao aperto botões, ou a controlar simples programas de computadores e aplicativos.

Nesses poucos meses de governo ilegítimo de Michel Temer vimos sua voracidade em devolver a contrapartida a esses grupos econômicos nacionais internacionais, ou seja, aos financiadores que receberam através das reformas da previdência e principalmente da reforma trabalhista tudo o que gastaram com a arquitetura e a construção social do golpe institucional de 31 de agosto de 2016.

*Marcio Kieller é secretário Geral da CUT/PR e Mestre em Sociologia Política pela UFPR

Fonte: CUT


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