Crise e castigo: a maximização do lucro às custas da mão de obra barata e fragilizada
Por Roberto Freire
Imersos em um dos momentos mais nefastos da história política recente do país, os brasileiros vivem mais um duro golpe empreendido por um governo que se aproveita da gravidade da crise econômica, e dos 13 milhões de desempregados, para promover uma completa deterioração das relações de trabalho no Brasil.
A reforma trabalhista proposta pelo governo Temer e seus aliados compõe, ao lado da reforma da Previdência e do congelamento dos gastos públicos, a base de um projeto político que levará o Brasil a uma profunda depressão, ameaça que já assombra países como Grécia e Espanha, que aderiram às medidas de austeridade semelhantes. A paralisação geral no dia 28 de abril, em diversas cidades, foi um sinal de que os brasileiros sabem que o que está em jogo é o direito a uma vida digna.
Por meio de um contorcionismo retórico, o governo tenta convencer a população de que a retirada de direitos e o aumento da “liberdade” de negociação entre patrões e empregados vão melhorar a vida do trabalhador e gerar novos empregos. Toda essa “boa vontade” da gestão Temer tem objetivos claros: a redução do custo da mão de obra e a sonegação de direitos trabalhistas, permitindo a superexploração do trabalho em todos os níveis de atividade. Até mesmo economistas alinhados à política econômica do governo admitem que a geração de novos empregos depende fundamentalmente da recuperação da economia e da capacidade em gerar demanda por bens e serviços.
Com o apoio de uma das legislaturas mais patronais e conservadoras da História do Congresso brasileiro, usam o PL 6787 para criar uma legislação trabalhista ao gosto dos grandes grupos econômicos, os mesmos que patrocinaram a ascensão de Temer e de boa parte dos parlamentares que o apoiam. Um grupo ansioso por maximizar margens de lucro e dispor de uma mão-de-obra barata e fragilizada.
Não por acaso, uma a cada três emendas acrescidas ao projeto original enviado pelo Executivo foi assinada por lobistas que representam os bancos, as grandes indústrias e entidades de transporte, segundo levantamento do site Intercept Brasil. São propostas que preveem restrições a ações trabalhistas, entraves para reconhecimento das responsabilidades do empregador, permissão de demissões em massa sem a necessidade de qualquer acordo, trabalho intermitente, entre outros ataques à CLT.
O desinteresse em promover uma ampla discussão com a sociedade e as centrais sindicais ficou mais evidente na votação a toque de caixa promovida pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia, o mesmo que defendeu publicamente que a Justiça do Trabalho “não deveria sequer existir”. Com emendas que ignoram a realidade do trabalhador brasileiro, na prática, o que se propõe é o fim dos sindicatos e da Justiça Trabalhista, cuja atuação plena já se encontra severamente prejudicada por cortes em seu orçamento, determinados pelo mesmo Congresso, e que já causam o fechamento de tribunais e redução do atendimento à população.
A prevalência do chamado negociado sobre o legislado, em que o acordado individualmente entre patrão e empregado prevalece sobre o que determina a lei, representa um retrocesso do sistema de proteção social a um patamar inaceitável. A Constituição já prevê essa possibilidade de acordo entre as partes, desde que não implique em perdas de direitos previstos pela legislação. Sem uma legislação que proteja adequadamente os trabalhadores, a corda vai, mais uma vez, arrebentar para o lado mais fraco.
Que poder de convencimento teria o empregado em negociar melhores condições de trabalho isoladamente com seu empregador? É acreditar que Davi terá sempre condições de derrotar o gigante Golias. A proposta de reforma ainda prevê a asfixia dos sindicatos com o fim sumário do imposto sindical, atingindo tanto os que não têm representatividade e usam desse recurso para fins alheios a sua missão, quanto os que construíram sua história com seriedade e baseados na luta por direitos dos seus representados.
A população brasileira não deve arcar com os castigos impostos pela cartilha de austeridade para conter a crise. Não podemos assistir a mais esse golpe de braços cruzados, divididos pela polaridade ideológica que tem caracterizado o debate político no Brasil. É preciso reagir para conter mais esse ataque, em nome do futuro das próximas gerações.
*Roberto Freire é vice-presidente da Federação Interestadual de Sindicatos dos Engenheiros (Fisenge)
Fonte: CUT Nacional
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