19/11/2024
Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra é conquista dos movimentos sociais
Entre 2012 e 2022 foram assassinadas 111 pessoas negras por dia, em média, no Brasil. O número é 2,7 vezes maior quando comparado ao assassinato de pessoas não negras. Os dados são do Atlas da Violência, divulgado em junho deste ano. Foram registrados 609.697 homicídios no período, desse total, 445.442 eram pretos ou pardos. O que corresponde a 73% dos homicídios contabilizados no país, informa o documento elaborado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP).
A população negra também é a que mais sofre com o desemprego. Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, divulgada em fevereiro pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), indicam que pretos, com 8,9%, e pardos, 8,5%, superaram a média nacional da taxa de desocupação de 5,9% para pessoas brancas.
Não são poucos os números que comprovam o racismo arraigado na sociedade brasileira e sofrido diariamente pelas pessoas pretas e pardas. Daí a importância de ter uma data, um feriado nacional, voltado a ampliar o debate sobre essa absurda situação. E este ano, pela primeira vez, o 20 de novembro, Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra será feriado em todo o Brasil. A Lei 14.759/2023 foi sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em dezembro do ano passado. A proposta, do senador Randolfe Rodrigues (PT-AP), foi relatada pelo senador Paulo Paim (PT-RS), e passou pela aprovação do Câmara dos Deputados e do Senado, em 2021 e 2023.
“Não é dia de celebração, mas uma data de reflexão para debater esse legado para a sociedade brasileira. A contribuição cultural dos negros, das negras, dos escravizados. Viveram a cruel escravização, mas sempre mantiveram a resistência, tanto na saída da África, quanto na chegada ao Brasil, e deixaram muitos legados”, salienta o secretário de Combate ao Racismo da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT), Almir Aguiar.
O Dia Nacinoal de Zumbi e da Consciência Negra foi instituído oficialmente pela Lei n.º 12.519, de 10 de novembro de 2011, no governo da presidenta Dilma Rousseff (PT), com o objetivo de conscientizar sobre o combate ao racismo e às desigualdades sociais a partir da questão étnica.
“Desde então, lutamos para que o 20 de novembro, que era celebrado em mais de mil cidades brasileiras e em alguns estados, como Alagoas, Amazonas, Mato Grosso, Rio de Janeiro e São Paulo, fosse feriado nacional”, lembra Almir. “Esse é o primeiro Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra como feriado nacional e vamos ver ganhar força o debate sobre as consequências da escravidão e do racismo que ainda assolam a sociedade brasileira.”
Para o presidente do Sindicato dos Bancários de Catanduva e região, Roberto Vicentim, o Brasil tem uma enorme dívida com os negros, por isso é imperativo criar políticas de reparação para o crescimento, valorização, justiça e reconhecimento.
"Percebe-se o desafio e a urgência de traçar estratégias específicas para combater o racismo estrutural, principalmente por meio de ações afirmativas que possam contrabalançar os efeitos históricos dessas discriminações. Mesmo com avanços importantes, conquistados pelo movimento sindical nos últimos anos, as instituições financeiras, por exemplo, e diversos outros setores da sociedade ainda mantêm mecanismos de exclusão que perpetuam o passado no presente e, portanto, cooperam com as desigualdades sociais e com o preconceito no Brasil. O racismo é uma ferida aberta e deve ser debatido e combatido até o dia em que as pessoas negras forem realmente livres", destacou Vicentim.
Memória de Zumbi
O secretário de Combate ao Racismo destaca, ainda, a importância do 20 de novembro no reconhecimento de Zumbi e Dandara dos Palmares como heróis da democracia no país. E reforça que, ao longo da história, muitos negros e muitas negras não tiveram o justo reconhecimento nos livros e nas matérias escolares que trazem os eventos que marcaram mudanças sociais e políticas no país.
“Isso demonstra a importância de reconhecer o 20 de novembro também para falar da vida e luta de Zumbi dos Palmares, pela liberdade, ao lado de outra liderança que precisa ser lembrada, que é Dandara dos Palmares. Aprender e memorizar a história de Zumbi e Dandara é melhorar a nossa consciência no combate à discriminação, ao preconceito e pelos direitos civis. Ações que possibilitam um futuro melhor, para todos e todas, independente de raça”, afirma Almir.
Como tudo começou
Um grupo de jovens negros, em 1971, reunia-se no centro da cidade de Porto Alegre, capital do Rio Grande do Sul, com o objetivo de estudar a história de seus ancestrais e refletir sobre o 13 de maio, data da abolição da escravatura. Desses debates surgiu a ideia de instituir o 20 de novembro, data da morte de Zumbi dos Palmares, como um marco de resistência e luta pela liberdade do povo negro.
Dessa forma nasceu o Grupo Palmares, associação voltada ao estudo da história e cultura afro-brasileira. O nome homenageia o Quilombo dos Palmares, símbolo de resistência à escravidão que perdurou por quase um século.
Foi uma longa luta até o Dia da Consciência Negra ser incorporado ao calendário escolar, em 2003, com a sanção pelo então presidente Lula da lei 10.639. A legislação tornava obrigatório, ainda, o ensino da história e da cultura afro-brasileira nas escolas, fortalecendo o reconhecimento da contribuição negra para a formação da sociedade brasileira.
Para a doutora em comunicação pela Universidade de Brasília e consultora de gênero e raça, Kelly Quirino, a data é uma forma de a sociedade reconhecer o protagonismo dos negros na formação do Brasil.
“E uma lei como essa impacta muito, porque é um dia que a gente celebra a importância que a população negra tem na formação cultural do nosso país, na formação sociológica, como força de trabalho”, diz. “Porque foi trabalho da população negra, durante a escravidão, que possibilitou o acúmulo de riquezas. Esse dia mostra que é uma população que sempre teve um protagonismo, que sempre ter sempre lutou e que a liberdade não foi dada, que ela foi conquistada à base de muita luta, a base de muitas mortes a partir de muita violência que a população negra sofreu durante os praticamente quatro séculos de escravidão no nosso país.”
Kelly Quirino acredita que o maior impacto desse feriado nacional é melhorar a autoestima das pessoas negras. “Porque você mostra que há um protagonismo, que há uma celebração positiva, desse líder negro, que lutou a e que faz parte da história do nosso país.”
O presidente da Fundação Cultural Palmares, João Jorge Rodrigues cita a inclusão de outros homenageados, além de Zumbi e Dandara. “Acotirene, Aqualtune, mulheres e homens que fizeram daquela experiência da República Negra, da República Popular Brasileira, entre 1595 e 1695, uma experiência exitosa.”
E ressalta que a transformação do 20 de novembro em data nacional de conscientização é uma conquista de várias gerações, que incluem pioneiros abolicionistas José do Patrocínio, Joaquim Nabuco, Luís Gama, o ex-escravizado que se tornou advogado. Também Maria Tomásia Figueira Lima, a aristocrata que lutou para adiantar a abolição no Ceará; André Rebouças, o engenheiro que queria dar terras aos libertos; Adelina, a charuteira que atuava como 'espiã'; Dragão do Mar, o jangadeiro que se recusou a transportar escravizados para os navios; e Maria Firmina dos Reis, a primeira escritora abolicionista.
A população negra também é a que mais sofre com o desemprego. Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, divulgada em fevereiro pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), indicam que pretos, com 8,9%, e pardos, 8,5%, superaram a média nacional da taxa de desocupação de 5,9% para pessoas brancas.
Não são poucos os números que comprovam o racismo arraigado na sociedade brasileira e sofrido diariamente pelas pessoas pretas e pardas. Daí a importância de ter uma data, um feriado nacional, voltado a ampliar o debate sobre essa absurda situação. E este ano, pela primeira vez, o 20 de novembro, Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra será feriado em todo o Brasil. A Lei 14.759/2023 foi sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em dezembro do ano passado. A proposta, do senador Randolfe Rodrigues (PT-AP), foi relatada pelo senador Paulo Paim (PT-RS), e passou pela aprovação do Câmara dos Deputados e do Senado, em 2021 e 2023.
“Não é dia de celebração, mas uma data de reflexão para debater esse legado para a sociedade brasileira. A contribuição cultural dos negros, das negras, dos escravizados. Viveram a cruel escravização, mas sempre mantiveram a resistência, tanto na saída da África, quanto na chegada ao Brasil, e deixaram muitos legados”, salienta o secretário de Combate ao Racismo da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT), Almir Aguiar.
O Dia Nacinoal de Zumbi e da Consciência Negra foi instituído oficialmente pela Lei n.º 12.519, de 10 de novembro de 2011, no governo da presidenta Dilma Rousseff (PT), com o objetivo de conscientizar sobre o combate ao racismo e às desigualdades sociais a partir da questão étnica.
“Desde então, lutamos para que o 20 de novembro, que era celebrado em mais de mil cidades brasileiras e em alguns estados, como Alagoas, Amazonas, Mato Grosso, Rio de Janeiro e São Paulo, fosse feriado nacional”, lembra Almir. “Esse é o primeiro Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra como feriado nacional e vamos ver ganhar força o debate sobre as consequências da escravidão e do racismo que ainda assolam a sociedade brasileira.”
Para o presidente do Sindicato dos Bancários de Catanduva e região, Roberto Vicentim, o Brasil tem uma enorme dívida com os negros, por isso é imperativo criar políticas de reparação para o crescimento, valorização, justiça e reconhecimento.
"Percebe-se o desafio e a urgência de traçar estratégias específicas para combater o racismo estrutural, principalmente por meio de ações afirmativas que possam contrabalançar os efeitos históricos dessas discriminações. Mesmo com avanços importantes, conquistados pelo movimento sindical nos últimos anos, as instituições financeiras, por exemplo, e diversos outros setores da sociedade ainda mantêm mecanismos de exclusão que perpetuam o passado no presente e, portanto, cooperam com as desigualdades sociais e com o preconceito no Brasil. O racismo é uma ferida aberta e deve ser debatido e combatido até o dia em que as pessoas negras forem realmente livres", destacou Vicentim.
Memória de Zumbi
O secretário de Combate ao Racismo destaca, ainda, a importância do 20 de novembro no reconhecimento de Zumbi e Dandara dos Palmares como heróis da democracia no país. E reforça que, ao longo da história, muitos negros e muitas negras não tiveram o justo reconhecimento nos livros e nas matérias escolares que trazem os eventos que marcaram mudanças sociais e políticas no país.
“Isso demonstra a importância de reconhecer o 20 de novembro também para falar da vida e luta de Zumbi dos Palmares, pela liberdade, ao lado de outra liderança que precisa ser lembrada, que é Dandara dos Palmares. Aprender e memorizar a história de Zumbi e Dandara é melhorar a nossa consciência no combate à discriminação, ao preconceito e pelos direitos civis. Ações que possibilitam um futuro melhor, para todos e todas, independente de raça”, afirma Almir.
Como tudo começou
Um grupo de jovens negros, em 1971, reunia-se no centro da cidade de Porto Alegre, capital do Rio Grande do Sul, com o objetivo de estudar a história de seus ancestrais e refletir sobre o 13 de maio, data da abolição da escravatura. Desses debates surgiu a ideia de instituir o 20 de novembro, data da morte de Zumbi dos Palmares, como um marco de resistência e luta pela liberdade do povo negro.
Dessa forma nasceu o Grupo Palmares, associação voltada ao estudo da história e cultura afro-brasileira. O nome homenageia o Quilombo dos Palmares, símbolo de resistência à escravidão que perdurou por quase um século.
Foi uma longa luta até o Dia da Consciência Negra ser incorporado ao calendário escolar, em 2003, com a sanção pelo então presidente Lula da lei 10.639. A legislação tornava obrigatório, ainda, o ensino da história e da cultura afro-brasileira nas escolas, fortalecendo o reconhecimento da contribuição negra para a formação da sociedade brasileira.
Para a doutora em comunicação pela Universidade de Brasília e consultora de gênero e raça, Kelly Quirino, a data é uma forma de a sociedade reconhecer o protagonismo dos negros na formação do Brasil.
“E uma lei como essa impacta muito, porque é um dia que a gente celebra a importância que a população negra tem na formação cultural do nosso país, na formação sociológica, como força de trabalho”, diz. “Porque foi trabalho da população negra, durante a escravidão, que possibilitou o acúmulo de riquezas. Esse dia mostra que é uma população que sempre teve um protagonismo, que sempre ter sempre lutou e que a liberdade não foi dada, que ela foi conquistada à base de muita luta, a base de muitas mortes a partir de muita violência que a população negra sofreu durante os praticamente quatro séculos de escravidão no nosso país.”
Kelly Quirino acredita que o maior impacto desse feriado nacional é melhorar a autoestima das pessoas negras. “Porque você mostra que há um protagonismo, que há uma celebração positiva, desse líder negro, que lutou a e que faz parte da história do nosso país.”
O presidente da Fundação Cultural Palmares, João Jorge Rodrigues cita a inclusão de outros homenageados, além de Zumbi e Dandara. “Acotirene, Aqualtune, mulheres e homens que fizeram daquela experiência da República Negra, da República Popular Brasileira, entre 1595 e 1695, uma experiência exitosa.”
E ressalta que a transformação do 20 de novembro em data nacional de conscientização é uma conquista de várias gerações, que incluem pioneiros abolicionistas José do Patrocínio, Joaquim Nabuco, Luís Gama, o ex-escravizado que se tornou advogado. Também Maria Tomásia Figueira Lima, a aristocrata que lutou para adiantar a abolição no Ceará; André Rebouças, o engenheiro que queria dar terras aos libertos; Adelina, a charuteira que atuava como 'espiã'; Dragão do Mar, o jangadeiro que se recusou a transportar escravizados para os navios; e Maria Firmina dos Reis, a primeira escritora abolicionista.
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